segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Imprensa e história recente do Brasil

(por Magno Córdova)

Nas eleições das “Diretas Já” para presidente da república no Brasil, em 1984, o Jornal da Tarde apresentou o que se considera a sua maior inovação em termos gráficos: na sua primeira página, anunciou a derrota do projeto das diretas oferecendo aos leitores apenas um retângulo preto, sem qualquer dizer, simbolizando o luto pela derrota.


         Em 1973, o editor do Jornal do Brasil, Alberto Dines, impedido de noticiar a morte de Salvador Allende, presidente socialista chileno deposto por uma junta militar chefiada por Augusto Pinochet, apresentou a primeira página do jornal sem manchetes e sem fotos. Com isso, ao mesmo tempo driblou a censura e denunciou sua ação.

         Entrevistado sobre sua participação no momento do golpe dado pelos militares em 1964, o general Olympio Mourão Filho declarou ter lido na manchete do jornal O Globo de 31 de março daquele ano que haveria se instalado um soviete na Marinha de Guerra. Preocupado com a presença comunista no comando da corporação, decidiu marchar com suas tropas e antecipar o golpe.

         A forma como a imprensa nos conta a História do país deve ser vista com cautela. Qualquer que seja a tentativa de um órgão de comunicação no sentido de tornar imparcial o acontecimento abordado, a informação dada trará em seu bojo as preferências ideológicas de quem a fornece. Nesse sentido, a matéria jornalística representa um documento muito útil para a identificação das correntes de pensamento dominantes entre os órgãos formadores de opinião em um determinado momento histórico.


Há um pequeno livro, paradidático, que pode servir como uma boa iniciação sobre o papel dos órgãos de imprensa no país. Seu título é “Imprensa e História do Brasil”, de Maria Helena Rolim Capelato. Foi publicado pela primeira vez em 1988, pela Editora Contexto. Encontra-se disponível em pdf no endereço: https://pt.scribd.com/doc/317069631/CAPELATO-Maria-Helena-Rolim-Imprensa-e-Historia-do-Brasil-Editora-Contexto-Sao-Paulo-1988-1-pdf



Abaixo, uma canção que joga luz sobre uma outra dimensão, inusitada (?) acerca dos usos dados ao jornal (vídeo com o áudio da música logo após o texto com a letra). No caso, o jornal utilizado por um migrante na São Paulo de meados do século XX. "Meu enxoval" é um coco de autoria de Gordurinha e José Gomes. Foi gravada por Jackson do Pandeiro em 1958. 

Eu fui para São Paulo procurar trabalho 
E não me dei com o frio 
Tive que voltar outra vez para o Rio 
Pois aqui no Distrito Federá 
O calor é de lascar 
E veja o meu azar: 
Comprei o "Jornal do Brasil" 
Emprego tinha mais de mil 
E eu não arranjei um só... 

Telegrafei para a vovó 
Ela tem uma bodega em Recife, Pernambuco 
Eu disse pra ela que estou quase maluco 
E que não tenho nem onde morar, o quê que há?

Estou dormindo ao relento, valei-me nossa Senhora! 
O meu travesseiro é um "Diário da Noite" 
E o resto do corpo fica na "Última Hora".

Mas se eu voltar, aquela turma lá do Norte me arrasa 
Principalmente o povo lá de casa 
Que vai perguntar por que é que eu fui embora. 
Por isso eu vou ficando 
Dormindo aqui na porta do Municipal 
Com quatro mil-réis eu compro o enxoval: 
"Diário da Noite" e a "Última Hora".


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