domingo, 11 de março de 2018

Saúde pública no Brasil: tá certo, Doutor!

(por Magno Córdova)

Texto produzido e apresentado por mim no Programa Outros 500, levado ao ar pela Rádio Inconfidência FM de Belo Horizonte nos anos 2001/2001.

O Rio de Janeiro deveria deixar de ser o território da barbárie e da escravidão, ao se tornar sede provisória do império lusitano. A imagem que os europeus tinham do principal porto do país deveria se transformar com a chegada de dom João VI. Foram determinadas mudanças na administração pública colonial e a capital se tornou o centro das ações sanitárias. Por ordem da corte foram fundadas as duas primeiras escolas de medicina do país: Rio de Janeiro em 1813 e Bahia em 1815. Após a independência, D. Pedro I ordenou a criação da Imperial Academia de Medicina, órgão consultivo do Imperador em questões ligadas à saúde pública nacional e que reunia os principais clínicos da cidade. O grande desafio enfrentado pelos médicos do império era evitar as doenças infecciosas que atingiam a população do Rio e se espalhavam por todo o país através dos viajantes. As maiores epidemias cariocas do período foram de varíola, febre amarela e cólera. Levantaram a hipótese de que essas epidemias seriam causadas por navios vindos do estrangeiro. As embarcações suspeitas de transportarem passageiros adoecidos eram submetidas à quarentena, em ilha próxima à baía de Guanabara. A prática do uso da vacina contra a varíola – criada na Inglaterra em 1796 a partir do pus retirado de bois infectados – foi uma exigência que teve rápida aceitação. Uma outra estratégia era convencer a população a se refugiar nas regiões serranas em períodos de crise. A quem não podia sair da cidade, era recomendado evitar o consumo de bebidas e frutas geladas que, segundo diziam, facilitavam as infecções. De tempos em tempos, os agentes de saúde convocavam a milícia a disparar tiros de canhão para movimentar o ar e afastar o perigo dos “miasmas” espalhados pelo céu da cidade. Por “miasmas” entendiam ser o ar corrompido que, vindo do mar, pairava sobre a capital.

Uma indicação para leitura é o livro “História da saúde pública no Brasil”, de Cláudio Bertolli Filho. Deixo aqui uma canção que, distanciada no tempo da abordagem acima - lançada na década de 1970 - trata, no entanto, de questões que dialogam com ele.

Tá certo, doutor (Gonzaguinha)

É um atentado à moral e aos bons costumes vigentes, por certo inconveniente
Deixar este homem doente perambular pelas ruas a cometer tais falcatruas
Incompatível com os estatutos dessa gafieira,
Dançar dessa maneira, desrespeitando o salão, desfigurando o padrão
Fere as normas do edital de formação da nossa firma atual

Esse homem está enfermo, nem precisa exame sério, seu mal está constatado
Depressa, põe no hospital!

Deve ficar bem isolado, em quarto bem fechado
Sem portas ou janelas, pois pode ser contagiante
Dieta mais que rigorosa, medicação bem adequada e muita observação
Pra que não haja agravantes
Em tempo hábil deve ir até o centro de controle para testar sua boa condição,
Se está fechada a ferida

Seu caso deve ser anotado, o seu mal ser vigiado e lhe requer muita atenção
Seu caso deve ser anotado, o seu mal ser vigiado e lhe requer muita atenção

Pois traz perigo à nossa vida
Não dou amparo, nem guarida
Dou guaraná, com pesticida
Pra acalmar minha dormida
Não tô afim de pôr em risco a minha condição


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