(por Magno Córdova)
A música “Pedro Pedreiro”, de Chico Buarque de Hollanda
surgiu em 1965, um ano após o golpe militar.
(Vídeo extraído do Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=ukyJzG9IePI)
Pedro Pedreiro
Composição: Chico Buarque de Holanda
Pedro pedreiro penseiro esperando o trem
Manhã parece, carece de esperar também
Para o bem de quem tem bem de quem não tem vintém
Pedro pedreiro fica assim pensando
Assim pensando o tempo passa e a gente vai ficando prá trás
Esperando, esperando, esperando
Esperando o sol, esperando o trem
Esperando aumento desde o ano passado para o mês que vem
Pedro pedreiro penseiro esperando o trem
Manhã parece, carece de esperar também
Para o bem de quem tem bem de quem não tem vintém
Pedro pedreiro espera o carnaval
E a sorte grande do bilhete pela federal todo mês
Esperando, esperando, esperando, esperando o sol
Esperando o trem, esperando aumento para o mês que vem
Esperando a festa, esperando a sorte
E a mulher de Pedro, esperando um filho prá esperar também
Pedro pedreiro penseiro esperando o trem
Manhã parece, carece de esperar também
Para o bem de quem tem bem de quem não tem vintém
Pedro pedreiro tá esperando a morte
Ou esperando o dia de voltar pro Norte
Pedro não sabe mas talvez no fundo
Espere alguma coisa mais linda que o mundo
Maior do que o mar, mas prá que sonhar se dá
O desespero de esperar demais
Pedro pedreiro quer voltar atrás
Quer ser pedreiro pobre e nada mais, sem ficar
Esperando, esperando, esperando
Esperando o sol, esperando o trem
Esperando aumento para o mês que vem
Esperando um filho prá esperar também
Esperando a festa, esperando a sorte
Esperando a morte, esperando o Norte
Esperando o dia de esperar ninguém
Esperando enfim, nada mais além
Da esperança aflita, bendita, infinita do apito de um trem
Pedro pedreiro pedreiro esperando
Pedro pedreiro pedreiro esperando
Pedro pedreiro pedreiro esperando o trem
Que já vem
Que já vem
Que já vem
Que já vem
Que já vem
Que já vem
“Construção e Deus lhe pague”
foram lançadas no mercado fonográfico em 1971.
(Vídeo extraído do Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=olJPFY6wHrM)
Construção/Deus lhe pague
Composição: Chico Buarque de Holanda
Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo por tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou prá descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
E agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego
Amou daquela vez como se fosse o único
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo por tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou prá descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
E agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público
Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Tijolo por tijolo num desenho mágico
Sentou prá descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contramão atrapalhando o sábado
Por esse pão prá comer, por esse chão prá dormir
A certidão prá nascer e a concessão prá sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir, Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair, Deus lhe pague
Pela mulher carpideira prá nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir, Deus lhe pague
Quando ouvimos a música do Chico
temos uma dimensão exata da precária situação da classe trabalhadora urbana
brasileira naquele período de ideologia do “milagre” econômico, sustentado por
“slogans” como “esse é um país que vai prá frente”.
O auge da ditadura militar
apontava para o fim do “milagre”, ao dilapidar a força de trabalho com o
favorecimento do grande capital e a manutenção, durante toda a década de 1970,
de níveis ínfimos de salário entre os trabalhadores. Com baixo nível salarial,
a alimentação de operários era precária. A extenuação da classe trabalhadora
chegou a ameaçar as demais classes sociais, através de epidemias. Em 1974, um
surto de meningite entre as camadas populares teve sua divulgação censurada até
atingir democraticamente outros setores da sociedade.
Retomando a obra de
Chico, em determinado verso da canção "Deus lhe pague" lemos: “pelos andaimes pingentes que
agente tem que cair...”. A média de acidentes de trabalho por dia útil,
registrados no Brasil durante o período que vai de 1971 a 1977, era de cerca de
5500 acidentes por dia. No ano de 1976 a média por dia atingiu 6355
trabalhadores vitimados por acidentes de trabalho.
Naquele ano, registrou-se a
esperança de vida do brasileiro ao nascer, a partir da sua faixa salarial. O
trabalhador que recebia menos de um salário mínimo por mês tinha 14 anos a
menos, de esperança de vida, comparando-se com aquele que recebia acima de
cinco salários mínimos.
O livro “História do Brasil recente (1964-1980)”, de Sonia Regina de Mendonça e Virgínia Maria Fontes, pela editora Ática, vai como sugestão de uma leitura inicial.
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